Começam a surgir indícios de
que a queda de juros propalada pelo governo tem fôlego mais curto do que o
prometido. Há muita pirotecnia nas ações anunciadas, mas até agora elas só se
mostraram boas para poucos. Com as evidentes limitações da economia brasileira,
a inflação também ameaça.
Desde o 1° de maio, quando
lançou sua ofensiva contra a "lógica perversa" dos juros, Dilma Rousseff
indicou que as instituições privadas deveriam fazer o dever de casa e seguir os
bancos oficiais, baixando agressivamente as taxas. Deveria ter olhado antes
para o próprio umbigo e percebido que não tinha lições a dar.
O discurso oficial não resiste
ao cotejo da realidade. Levantamento divulgado anteontem pelo Banco Central mostra
que Banco do Brasil e Caixa não estão entre os que cobram menos para emprestar
a seus clientes. Em alguns casos, pelo contrário, estão entre os mais usurários
- mesmo com os cortes recentes.
Numa das linhas divulgadas pelo
BC, a de conta garantida, o BB aparece como dono da nona taxa mais alta num
ranking com 38 instituições, informou a agência Reuters.
Na concessão de linhas de crédito pessoal, Caixa e BB apresentaram apenas a 13ª
e a 32ª melhores taxas, respectivamente, de um total de 91 instituições
consultadas. Ou seja, em banco de ferreiro, o juro é de pau.
Ontem, em nova rodada de foguetório,
o Banco do Brasil anunciou a redução de suas taxas de administração. É ótimo
que isso aconteça e teria sido melhor ainda se o governo tivesse cortado os
encargos antes de ter tungado a poupança dos brasileiros. Mas se é para cortar,
a conversa tem que ser para valer, ser boa pra todos.
O que o BB fez, porém, foi mero
malabarismo. Os oito fundos cujas taxas foram reduzidas cobravam até 3,5% para
administrar o investimento de seus clientes. Isto é quase metade do rendimento
projetado. Agora, os encargos caíram para entre 1,5% e 2,6% - portanto, ainda
altíssimos.
Para não apanhar das cadernetas
de poupança, os fundos de renda fixa que o governo diz estar oferecendo
baratinho para a clientela só poderiam cobrar taxa de administração de, no
máximo, 0,64%, calcula o professor Marcelo Moura. O BB não apenas cobra muito
mais, como também obriga seus correntistas a aderir a um programa pelo qual espetam
até R$ 54 de mensalidade na carteira do cliente.
Outro aspecto da estratégia
voluntarista do governo é o efeito das ações sobre a contabilidade dos bancos
oficiais e, em última instância, sobre o bolso dos contribuintes. Ontem, a
Caixa anunciou que, em função de sua agressiva concessão de empréstimos,
precisará de aporte "urgente" da União: estima-se algo como R$ 10 bilhões,
segundo a Folha
de S.Paulo.
Não é apenas o marketing em
torno da redução dos juros que se mostra distante da realidade cotidiana.
Limitações de ordem econômica geral começam a indicar que a inflação não será
amansada apenas no gogó, restringindo o espaço e as possibilidades de cortes
mais incisivos na taxa básica de juros.
Em abril, os preços subiram num
ritmo três vezes maior do que no mês anterior. O IPCA passou de comportado
0,21% para um ousado 0,64%. A alta não foi só do cigarro, como disse ontem
Guido Mantega, mas disseminada por 2/3 dos preços. Neste mês de maio, os
índices virão pressionados também por aumentos de tarifas de energia elétrica, água
e esgoto.
Para piorar, o índice que mede exclusivamente
o comportamento dos preços dos serviços disparou: de janeiro a março, tinha subido
2,86% e em abril escalou a 3,62%, mostrou ontem O
Estado de S.Paulo. Nesta dinâmica, a subida do dólar - com alta de 7%
nos últimos 30 dias - não ajuda.
A redução dos juros é muito
bem-vinda. Mas é preciso muito mais do que ações cosméticas, voltadas a
produzir mais fagulha do que luz. O governo deveria ocupar-se de medidas que
gerassem efeitos benéficos duradouros sobre o ambiente econômico. Da forma
atabalhoada como age, pode acabar atiçando mesmo é fogo.
Instituto Teotônio Vilela
Nenhum comentário:
Postar um comentário