É injustificável a lentidão com que
tramita a ratificação de acordos internacionais no país. Os últimos números do
Itamaraty apontam uma fila de 313 tratados assinados pelo Brasil ainda sem aval
do Legislativo. Muitos deles negociados há mais de uma década, como a Convenção
nº 158, de 1982, da Organização Internacional de Trabalho (OIT), ou a convenção
sobre direitos dos trabalhadores migrantes adotada pelas Nações Unidas em 1990!
É, no mínimo, incoerente que um país
que tanto luta por protagonismo no cenário internacional seja tão negligente em
relação à ratificação de acordos bilaterais ou multilaterais.
Acordos que, em
princípio, são negociados não por um ou outro governo, mas pelo Estado
brasileiro.
O Ministério das Relações Exteriores é
o primeiro a travar a tramitação dos tratados internacionais. Seja por
burocracia, seja por zelo excessivo, não importa. Nada justifica que um tratado
demore meses ou até anos a fio para sair do Itamaraty, passar pela Casa Civil e
chegar ao Congresso Nacional.
É o caso do tratado de extradição
firmado entre Brasil e China em 2004. Foram quatro anos até que o documento
chegasse ao Parlamento. Depois, outros seis para que, enfim, fosse aprovado
pela Câmara dos Deputados. Às vésperas da visita do presidente chinês, Xi
Jinping, ao Brasil, o tratado acabou aprovado a toque de caixa no Senado, menos
de duas semanas depois de ter chegado à Casa.
No fim do ano passado, a visita do
presidente francês, François Hollande, também precipitou uma corrida para a
aprovação de um acordo bilateral que se arrastava há anos entre Executivo e
Câmara dos Deputados. O acordo de combate ao garimpo ilegal de ouro na
fronteira entre a Guiana Francesa e o estado do Amapá havia sido assinado em
2008 pelos dois países. Sem a visita do presidente Hollande, provavelmente
ainda estaria pendente de ratificação.
Outro caso que chama a atenção é o
tratado internacional que impõe limites à venda de armas convencionais — de
armas leves a mísseis e tanques de guerra. Esse é um tratado histórico, cuja
aprovação por maioria esmagadora na Assembleia Geral das Nações Unidas, em
abril de 2013, foi aplaudida por organizações de direitos humanos e de controle
de armas no mundo inteiro.
O Brasil foi um dos maiores defensores
do tratado de comércio de armas. Aliás, foi o primeiro país a assiná-lo. Mas,
um ano e dois meses depois, o documento ainda nem saiu do Executivo.
No Parlamento, o caminho de um tratado
internacional também é longo. No Senado, nem tanto, porque os processos são
distribuídos apenas à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional e a
espera para inclusão na pauta do plenário não pode, pelo regimento, passar de
30 dias.
Na Câmara, no entanto, acordos
internacionais precisam passar não só pela Comissão de Relações Exteriores,
como pela Comissão de Constituição e Justiça, por comissões temáticas e pela
Comissão de Finanças e Tributação, quando há repercussão financeira para o
Estado brasileiro.
Foi para abreviar esse rito que o
Senado aprovou, no último dia 5, o regime de urgência para tramitação de
tratados internacionais. A proposta de emenda constitucional, que ainda tem que
passar pela Câmara, é um avanço, embora não resolva de vez a questão.
Uma solução definitiva exige interesse
público e vontade política. Exige, acima de tudo, a clareza de que acordos
bilaterais e multilaterais são vitais num mundo em que a cooperação
tecnológica, comercial e científica é cada vez mais dinâmica. E em que a
integração e o respeito às normas internacionais são regras básicas para quem
almeja ter voz forte num cenário globalizado.
Ricardo Ferraço
Senador pelo PMDB do
Espírito Santo e presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa
Nacional do Senado Federal
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