A
população brasileira tem uma enorme virtude: é extremamente generosa. Por isso
mesmo, tem um enorme problema: parte dela recusa-se a aceitar a miserável
realidade física do mundo no qual tem que viver. Acredita na existência de uma
alternativa benevolente ao alcance de uma mão com suficiente “coragem
política”. É contra a aritmética e a história, como revela a preocupante e
acalorada discussão sobre o projeto de lei que pretende regular a
“terceirização” do trabalho.
É
preocupante porque, de fato, o emprego de todo cidadão que pode e quer
trabalhar, o direito a uma remuneração razoável que lhe permita sustentar a sua
família e participar de um “fundo coletivo” que no fim do dia lhe garanta uma
subsistência decente, são a essência da sociedade civilizada que estamos
construindo a partir da Constituição de 1988. É necessariamente acalorada
porque vai ao cerne dos interesses da “elite” sindicalista ergófoba montada no
imposto sindical. Ela sabe que o seu poder depende do controle da “entrada” dos
trabalhadores nos diferentes setores do sistema econômico. Sua situação é
delicada. Tem que fingir que é “vanguarda” mas precisa combater o inexorável
avanço da tecnologia que é o gerador das mudanças das condições que alteram as
posições relativas dos trabalhadores.
Destroem-se
empregos. Criam-se outros que exigem novos conhecimentos e habilidades. Isso
tem custos sociais e riscos econômicos que, evidentemente, devem ser
enfrentados por políticas públicas de solidariedade social. Esta deve mitigá-los
sem comprometer o aumento da produtividade total do trabalho que é o que
induzirá a passagem da organização obsoleta para a nova que responde ao avanço
da tecnologia.
Vamos
combinar: os nossos luddistas repetem dois séculos de fracassos dos sindicatos
de inibir o avanço da tecnologia. Eles deveriam preocupar-se em aumentar a
apropriação pelo trabalhador nos ganhos da produtividade, em lugar de
combatê-la. Os argumentos contra a terceirização (sujeita aos controles da
proposta do projeto de lei) são opiniões ideológicas de alguns intelectuais, na
maioria funcionários públicos bem instalados em carreiras confortáveis e de
partidos exóticos, ambos apoiados no “fundo de comércio” de um socialismo
“idealizado” que não é alternativa viável para o horrível capitalismo “real”
que nos oprime.
Com
todos os seus inegáveis defeitos, o capitalismo real, com sua destruição
criadora, produziu um desenvolvimento material e humano muito maior do que o
socialismo “real” criado por intelectuais quando tiveram oportunidade…
Delfim
Netto ex-ministro da Fazenda e escreve às quartas-feiras na Folha de S.Paulo –
Opinião
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