
Teoria da conspiração. E bota conspiração nisso!
Será que vale discutir o mérito da causa a ser analisada dia 24? Não, porque isso é ocupação de juiz, que julga com base nos autos, nas provas, nos indícios, nas perícias. Quem julga politicamente é o Congresso, quando cassa um/a presidente. Ou de uma assembleia, quando cassa um governador. A menos que concordemos com a existência de uma gigantesca teoria da conspiração pela qual Lula teria sido levado às barras dos tribunais exclusivamente porque é preciso tirá-lo da disputa. Difícil acreditar que o Judiciário brasileiro, na sua totalidade, se preste a um papel desses. E não haja um – um só juiz, entre os milhares, e há vários deles que são petistas – que denunciasse tal canalhice. Sem deixar de reconhecer, é claro, a existência de politização aguda em atitudes como a de Moro quando ordenou a condução coercitiva e desnecessária de Lula. Ou naquele power-point tendencioso do Dallagnol, com a foto de Lula no centro da “organização criminosa”. Ou mesmo nos “vazamentos seletivos” da Lava Jato etc, etc, etc. E bota etc nisso. Pressentindo um resultado desfavorável, os petistas estão entrando de sola, convocando a militância pra chutar o pau da barraca em Porto Alegre. Um deles, o sindicalista Urias Rocha, do PCdoB, propôs “começar a estourar a cabeça de coxinha, de juiz, mandar esses golpistas pro inferno”. Foi desautorizado e desligado da legenda. Em compensação a própria presidente do PT, senadora Gleisi Hofman (também enrolada na Lava Jato), arrepiou-se e acusou os juízes de descerem “ao play da política”, ou seja: acusou-os de agirem politicamente no julgamento (que ainda nem ocorreu!) da denúncia. E ameaçou, com a faca nos dentes: “Para prender Lula vai ter de prender muita gente, e vai ter de matar!”
Incentivo ao crime é crime
Desde que me entendo por gente ouço dizer que decisão judicial se discute, sim. Mas, primeiro, se cumpre. Aí recorre ao bispo ou ao Papa Francisco, se achar que deve. Agora, tentar impor um resultado na marra – “absolvição é o único resultado capaz de resgatar a seriedade da justiça brasileira”, “Se Lula for condenado tem que morrer gente!” (Gleisi Hofman) – soa como ameaça inadmissível. Ou um habeas-corpus preventivo para posicionar o partido na trincheira eleitoral. Os petistas têm todo o direito de irem a Porto Alegre se manifestar favoravelmente ao seu líder. Mesmo direito que têm os coxinhas de se manifestarem contra Lula. Faz parte do ritual democrático, mas que sejam manifestações pacíficas, caso contrário é crime insuflar a militância para a barbárie, para “estourar cabeça de coxinha”, para o “vai ter de matar”. A imunidade parlamentar não cobre um despautério desse, mesmo sob a alegação de que é apenas arroubo de retórica de quem tem o narizinho arrebitado.
Me enganei de novo, quebrei a cara
Ah, meu bem, você está pensando que eu esqueci. Esqueci não, meu dengo. Mas desconfio que não vai ser desta vez que você vai bater palmas pro Safadão. Sabe quem disse “Quem sou eu para dar palpite sobre decisão judicial?” Pois foi o ex-presidente Lula em junho do ano passado, ao saber do resultado do julgamento da chapa Dilma-Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que manteve na presidência o pai do Michelzinho, aquele senhor que mora no Jaburu, onde recebe na garagem os Wesleys da vida, e anda com a popularidade abaixo do pré-sal. Coincidência, né, meu xamego? Não sei por quê, mas de repente me lembrei de uma música do chato do Safadão que ouvi no rádio outro dia. A letra dizia, a certa altura: “Me enganei de novo, quebrei a cara/ Mais uma vez, eu tomei porre por você/ Mais uma vez, meu coração deu PT”.
Paulo José Cunha é professor, jornalista e escritor.
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