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quinta-feira, 28 de junho de 2018

'Os miseráveis que receberam um auxílio se tornaram lulistas de carteirinha', diz André Singer

28_06_manifesto_dilma_e_lula_foto_ricardo_stuckert_instituto_lula.jpgHá quase três meses na prisão, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mantém suas intenções de voto no patamar de 30% nas pesquisas eleitorais para a sucessão presidencial. A resiliência dos números do petista, segundo o cientista político André Singer, é fruto da lealdade de eleitores que superaram a miséria no período entre 2003 e 2010 graças a políticas públicas, como o Bolsa Família, criadas pela gestão petista. De acordo com Singer, esse grupo de eleitores - pobres, conservadores e até então avessos a candidatos de esquerda - se converteu à Lula em 2006 depois de ver implementado um programa de governo que, de forma não revolucionária, reduziu a pobreza sem alterar o status quo da sociedade brasileira, o chamado lulismo.
Doze anos mais tarde, esse eleitorado se mantém fiel, embora nesse meio tempo, o lulismo tenha ido do auge - com a reeleição de Lula e a chegada de Dilma Rousseff ao Planalto - à crise, com as jornadas de junho de 2013, o impeachment da petista, em 2016, e a prisão de Lula em 2018.
Ex-porta-voz do governo Lula e uma das principais vozes intelectuais dentro do PT, Singer se debruça sobre as razões do declínio do lulismo em seu recém-lançado O Lulismo em Crise (Companhia das Letras). Para ele, os movimentos de Dilma para tentar acelerar as transformações sociais trazidas pelo lulismo - por meio de forte intervenção na economia e política econômica desenvolvimentista -, sua aversão a antigos aliados partidários e seu estilo pessoal de gestão a levaram à queda.
Em entrevista ele analisa os movimentos que levaram ao impeachment de Dilma e destrincha seus efeitos para o cenário atual de sucessão presidencial.
Eis a entrevista.
Se Lula tivesse sido eleito em 2014, no lugar de Dilma, o desfecho do impeachment e crise teria sido o mesmo?
Provavelmente não. Provavelmente ele teria de início enfrentado as mesmas dificuldades porque o quadro que estava posto já era um quadro muito difícil já que os dois ensaios que a Dilma realizou, o desenvolvimentista e o republicano, acabaram gerando duas frentes opostas. No entanto, o Lula é um político com uma habilidade e com um acúmulo de experiência que talvez hoje não tenha igual no Brasil tirando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso - eles são relativamente paralelos embora haja diferenças entre ambos.
Com essa experiência e essa capacidade, ele teria enfrentado essas mesmas dificuldades de outra maneira. E ele não se furtou a dar sugestões para Dilma, na verdade mais do que sugestões, ele deu uma orientação sobre o que ela deveria fazer logo após a reeleição. Esse é, aliás, um momento muito agudo de todo o processo que levou ao impeachment porque, se houve um afastamento entre Dilma e Lula, o momento de maior afastamento foi exatamente aquele pós-reeleição dela, em que há praticamente uma ruptura.
Entre novembro de 2014 e outubro de 2015, a ex-presidente Dilma resolveu fazer tudo por conta dela, quase como se estivesse imaginando que aquele era o momento de fazer o seu governo, o que se mostrou um erro de cálculo incrível. Não que ela não tivesse direito a fazer o governo dela, mas o problema não está na legitimidade, mas tinha contra ela uma frente antidesenvolvimentista muito poderosa e uma frente antirrepublicana majoritária no Congresso, como já estava evidente com a vitória de Eduardo Cunha em fevereiro de 2015.
A atuação de Dilma em relação à Operação Lava Jato gerou mal-estar no PT? O combate à corrupção abalou a sustentação dada pelo partido a ela?
Esse assunto nunca ficou claro e a pesquisa que eu fiz não permite fazer afirmação categórica a respeito. O que aparece aqui e ali é que houve resistência de setores em relação a determinadas medidas, mas isso nunca ficou explícito e o partido nunca tomou uma posição oficial contrária ao movimento que ela fez no sentido de retirada de círculos clientelistas incrustrados no Estado, ou seja, sobre isso não há elementos claros.
O lulismo errou em sua interpretação sobre a mobilidade das classes? Há fidelidade entre os pobres e o lulismo?
Você tem um primeiro movimento que é a ascensão dos miseráveis. Esse é o mais forte de todos os movimentos que o lulismo produziu. Segundo o economista Valdir Quadros, tínhamos 24% de miseráveis em 2002 e essa proporção cai para 7% em 2014, na população brasileira. Aqui você tem uma redução importante e que tende a ser estrutural. Quanto a isso, não houve engano, os dirigentes do lulismo entenderam bem o que estava acontecendo e souberam tanto gerenciar esses programas que levaram a esse resultado quanto compreender os seus limites.
O que houve foi um aproveitamento de propaganda, tentando em algum momento fazer com que parecesse que esses brasileiros que saíram da miséria estavam indo direto para uma condição de classe média, como se fosse praticamente um milagre, o que na realidade não aconteceu. O que aconteceu foi um movimento importante de saída da condição miserável de uma parcela expressiva da população, mas que entrou numa condição de pobreza, não de classe média. E é por isso que quando você olha para o número de pobres, segundo os dados do Valdir Quadros, em 2002 nós tínhamos 29% de pobres e esta proporção cai para 23%.
A redução é muito menor, não porque os pobres de 2002 não tenham melhorado de vida, eles certamente melhoraram, mas foram substituídos por novos pobres que eram os antigos miseráveis. Com isso, o estoque de pessoas em condição de pobreza ficou relativamente estável. Eu não estou subestimando a importância dessa ascensão, porque significa a diferença entre comer 3 vezes ao dia e não comer.
Esses antigos pobres que melhoraram de condição, e foram em número expressivo, de dezenas de milhões, entraram no que chamo de uma nova classe trabalhadora, e aí sim houve um engano dos dirigentes do lulismo, que não se aplicaram ao trabalho de politização dessa nova classe trabalhadora que precisaria ter sido conscientizada de que não estava mudando de condição apenas por seus próprios méritos, mas sim porque houve um conjunto de políticas públicas orientadas para ajudar esse setor a mudar de condição.
"Aí sim houve um engano dos dirigentes do lulismo, que não se aplicaram ao trabalho de politização dessa nova classe trabalhadora"
Não existindo esse trabalho de politização, você encontra uma quantidade significativa de pessoas que transitaram de uma condição de pobreza para a nova classe trabalhadora e que entendem que essa ascensão decorreu de seus méritos individuais. Claro que os méritos individuais existem, mas quando você olha para o conjunto, para o movimento de classe, você percebe que o mérito individual não é suficiente. Uma pessoa pode ser muito trabalhadora e talentosa, mas se não tem emprego disponível, ela não consegue.
Para os miseráveis, o lulismo ficou marcado por conta de políticas como o Bolsa Família, é isso? Já o pobre que ascendeu não teve uma marca tão forte a ligá-lo com o lulismo?
É exatamente isso, e isso tem um resultado político muito importante. Porque os antigos miseráveis que receberam um auxílio, esses se tornaram lulistas de carteirinha, tão fiéis que agora estão declarando voto no ex-presidente Lula mesmo ele estando preso. Os outros não tiveram essa percepção, uma parte significativa dos antigos pobres que se tornaram classe trabalhadora não perceberam esse movimento como um resultado de lulismo e não estabeleceram esse canal de lealdade que os antigos miseráveis estabeleceram.
Por outro lado, há uma fatia do eleitorado que votava no Lula e agora expressa preferência por Bolsonaro. O que explica esse movimento?
O que está motivando o grosso da intenção de voto no ex-presidente Lula é a memória que ficou de um tempo melhor e a associação do lulismo com uma ascensão social que abria novas perspectivas de vida, as pessoas querem que isso volte. Isso é um elemento forte. A passagem de eventuais eleitores que declaram voto no ex-presidente Lula e na ausência dele podem declarar a intenção de votar no Bolsonaro está ligado ao fato de que, provavelmente, também para estas pessoas, a questão da segurança passou a ser prioritária.
"Esse é um fenômeno novo no Brasil: juntamente com a aspiração por emprego, saúde e educação, há o desejo por segurança pública"
Esse é um fenômeno novo no Brasil: juntamente com a aspiração por emprego, saúde e educação, há o desejo por segurança pública. Houve um aumento significativo da criminalidade no Brasil nos últimos 20 anos e em certas periferias metropolitanas fala-se em uma situação desesperadora. É compreensível que pessoas que tenham uma certa distância da informação política e do debate político não identifiquem a enorme polarização que existe entre Bolsonaro e Lula, porque na realidade, quando você olha mais de perto, percebe que o Bolsonaro e seus eleitores querem eliminar o lulismo, então é claro que há uma certa dessintonia entre poder transitar de um voto no ex-presidente Lula em um voto no Bolsonaro, mas creio que a explicação está na segurança pública.
A segurança vai ser mais importante do que a economia na definição do voto?
Eu não diria que tenha se tornado mais do que a economia. Essa questão do que é mais determinante no voto tem que ser estudado empiricamente. Minha intuição diz que a economia continua sendo determinante, mas, no hall de peso de variáveis, segurança pública subiu.
Essa nova classe trabalhadora, os pobres que ascenderam e não estabeleceram lealdade com o lulismo, esteve entre os que se insurgiram em junho de 2013, movimento que desestabilizou o governo Dilma?
Os dados que eu examinei mostram que havia uma metade da população presente nas ruas que podemos chamar de classe média tradicional, que é aquela pessoa que já é a segunda geração de classe média - pelo menos os pais já estavam na classe média. São aquelas pessoas que têm acesso a planos de saúde privados, aquelas que têm acesso às escolas privadas no ensino fundamental e médio e aqueles que fazem viagens para o exterior. Mas a outra metade dos manifestantes não tinha alta renda. Não era de baixíssima renda, o subproletariado não foi às ruas, mas as pessoas que estão na metade inferior de renda estavam lá.
Outro elemento que corrobora a tese de que a nova classe trabalhadora foi às ruas é que eles eram jovens, entre 25 e 39 anos, e tinham uma escolaridade alta - pelo menos o ensino médio completo e havia uma alta proporção de universitários, estudantes ou formados. Nós sabemos que houve uma explosão do ensino universitário graças ao Fies, o ProUni, etc, no período do lulismo. Então dá a impressão de que uma parte significativa desses manifestantes pertencia a essa nova classe trabalhadora.
Eu não diria que em um primeiro momento eles foram para a rua contra o governo Dilma. Havia ali um caráter difuso, porque os movimentos começam como um movimento de esquerda, puxados pelo Movimento Passe Livre, e acabam com uma tonalidade bem de direita, com essa coloração amarela das camisetas da seleção e até a expulsão de setores de esquerda como aconteceu na Avenida Paulista no dia da maior manifestação no caso da cidade de São Paulo. Esse caráter difuso, que era um pouco tudo e nada ao mesmo tempo...havia uma espécie do espírito de "que se vayan todos" (bordão usado na crise Argentina de 2001). Uma espécie de repúdio geral à representação, e aí envolvendo também o governo federal.
O problema é que depois isso foi se derivando para um movimento de repúdio ao lulismo, do qual a esquerda não participou, já em 2015 e 2016. A gente pode observar uma continuidade de parte do que aconteceu em junho e as manifestações de 2015 e 2016 em favor do impeachment, passando pela Lava Jato. Há um fio amarelo que junta junho de 2013 a março de 2016, que é o momento em que aquela grande manifestação a favor do impeachment acabou, na minha opinião, decidindo o jogo contra Dilma.
Há comparação ou continuação entre junho de 2013 e a greve dos caminhoneiros em maio de 2018?
O que eu vejo como elemento comum é uma presença importante das redes sociais. E as redes sociais parecem transformar a mecânica do processo de manifestação, que acaba incidindo sobre seu próprio conteúdo. Ocorre como uma concentração de debate público em caminhos invisíveis, ele não acontece em um espaço no qual estamos acostumados a olhar, o espaço dos jornais, das televisões abertas, até mesmo das televisões fechadas de maior audiência. Parece que ele ocorre em uma outra faixa e esses debates submersos levaram, no meio da greve dos caminhoneiros, ao aparecimento de inúmeros grupos espalhados pelo país inteiro pedindo intervenção militar, o que é algo que não está muito no radar de quem acompanha o debate mais tradicional.
"As redes sociais parecem transformar a mecânica do processo de manifestação, que acaba incidindo sobre seu próprio conteúdo"
No entanto, tal como em 2013, não importa, o fato é que essas pessoas estão aí e começam a se manifestar aí sim, dentro do espaço tradicional, quando, por exemplo, aparece uma reivindicação desse tipo, de intervenção militar. Houve um momento assustador durante a greve dos caminhoneiros em que, apesar de o governo já ter feito muitas concessões, os caminhões não saiam das estradas, e à pergunta 'mas qual é a reivindicação de vocês?', a resposta era: 'intervenção militar'.
É claro que isso não é oficial, não é generalizado, algo que você possa atribuir a um movimento estável, mas é algo que começou a pipocar de uma tal maneira que você não sabe onde aquilo poderia terminar, tal como aconteceu em junho de 2013.
Há um fio de continuidade entre um momento e outro?
Algum fio tem. Mas nesse momento eu não saberia dizer exatamente qual é. O que a gente consegue perceber é que há manifestações pela volta da ditadura, um saudosismo da ditadura, já em junho de 2013, embora seja um segmento muito minoritário, mas ele reaparece no processo do impeachment. Algum elemento de continuidade existe nesse desejo de um retrocesso autoritário.
E esses movimentos e seus desdobramentos são imprevisíveis para o governo, a sociedade, os pensadores, a imprensa?
Eu acho que o fenômeno das redes sociais têm um impacto na política novo, forte e difícil de aprender. Pouco a pouco nós estamos localizando o que está acontecendo. E o que está acontecendo é que você tem a emergência de setores da população, do eleitorado, que tem um viés autoritário e isso fica mais claro quando a gente observa as intenções de voto do candidato Bolsonaro, que tem uma posição que é simpática ao endurecimento, para dizer algo suave.
Ele usa muito as redes sociais, está bastante associado às Forças Armadas, porque é um ex-militar, e há uma expressão mais pública desse fenômeno, o que nos permite começar a entender do que se trata. À medida que isso vai ficando mais definido, a preocupação cresce, porque em determinados cenários, esse candidato chega a ser próximo dos 20% de intenções de voto, o que está longe de representar uma maioria, mas é um elemento já suficientemente significativo para ser considerado parte do jogo.
Quão cativos são hoje os eleitores do lulismo e qual o potencial de transferência de votos de Lula para outro candidato que represente esse projeto?
O que existe hoje é uma surpreendente pressão na direção de tirar o lulismo do jogo. E um dos elementos dessa configuração é a prisão do presidente Lula, que literalmente o subtrai do dia a dia da política. Ele continua participando porque tem justamente por trás de si este passado do realinhamento (eleitoral, de 2006), mas é claro que ele não pode fazer como se estivesse em liberdade. Segundo o Datafolha, 30% dos eleitores declararam que votariam em alguém que ele indicasse e 17% que talvez o fizessem, então você tem 30% bastante inclinados a seguir a orientação dele e mais 17% que poderiam seguir. Fazer qualquer previsão para além do que temos de dados é temerário, porque a situação está muito incerta, mas eu diria que com o quadro que nós temos hoje, devo dizer que apesar dessa enorme pressão contra o lulismo, ele sobrevive.
Faz sentido a estratégia petista de manter Lula como candidato pelo máximo de tempo possível antes de outubro?
É uma estratégia muito arriscada, na minha opinião, porque eu acho que uma parte desse eleitorado não tomou consciência dos riscos que pesam sobre a candidatura Lula, que tem pouca probabilidade de efetivamente se concretizar por motivos judiciais. Por isso, a estratégia que está posta é arriscada porque ela diminui o tempo de informação para que esses eleitores, que são eleitores distantes da política, possam digerir e absorver uma nova situação com uma indicação.
No entanto, como contrapartida a esse risco, a estratégia mantém as atenções voltadas para o ex-presidente Lula, que é o principal pivô do lulismo, e se ela for bem sucedida, permitiria uma ultrapassagem com êxito desse momento muito complicado para o lulismo.
O lulismo sobrevive ao Lula?
Em teoria ele sobreviveria plenamente. O lulismo tem a vocação de ser algo que percorra a história brasileira como o peronismo percorre a história argentina.
"O lulismo tem a vocação de ser algo que percorra a história brasileira como o peronismo percorre a história argentina"
O lulismo precisa ser personificado em alguma figura? Depois do Lula, quem poderia ser essa figura, o Haddad personifica o que é o lulismo?
A minha tendência é achar que sim, que ele precisa ter essa figura e que a dificuldade está em que há poucas situações precedentes em que o candidato natural está preso e impedido de concorrer e, portanto, precisa indicar alguém. De fato, o substituto mais falado até esse momento é o ex-prefeito Fernando Haddad, eu acredito que nós vamos ter uma experiência nova de ver, se ele for de fato o indicado, como o eleitorado reagirá a essa indicação e, sobretudo, a incerteza é quando ela será feita. Mas a minha impressão é que sim, precisará haver alguém que personifique o lulismo na impossibilidade do ex-presidente concorrer.
Não há uma figura que esteja posta, um herdeiro evidente?
Eu acho que o presidente Lula tem evitado que isso aconteça. Eu acredito que ele deve ter entendido que é mais proveitoso para o lulismo nesse momento que ele siga sendo a referência principal e tem evitado de passar ou construir explicitamente um substituto, embora provavelmente ele tenha que fazê-lo mais adiante.
O programa econômico defendido por Dilma é hoje encampado por Ciro Gomes, o candidato do campo da esquerda hoje mais citado pelo eleitor, quando Lula está fora do cenário. Não faria sentido que o PT apoiasse Ciro? Por que essa reunião pode não se dar?
De fato, há muitos pontos de coincidência entre o programa efetivo da ex-presidente Dilma no seu primeiro mandato e certas orientações que emanam do discurso do candidato Ciro Gomes. Como o atual candidato Ciro Gomes tem um certo componente de imprevisibilidade, nós não sabemos exatamente qual programa ele vai apresentar, mas tendo a achar que sim, que ele tende a se orientar por medidas que lembram o que a ex-presidente Dilma tentou fazer. É possível, ou até provável, que ele enfrente as mesmas dificuldades que ela enfrentou.
O Ciro tem um componente de imprevisibilidade, não sabemos nesse momento se ele vai tender a alianças mais à esquerda ou mais à direita, isso faz muita diferença para saber qual postura o PT, o lulismo e o ex-presidente Lula deveriam tomar, porém, eu diria que, com essa ressalva, a tendência é que ele acabe ficando no campo à esquerda do centro. Nesse sentido, acho quase inevitável que ele permaneça sempre como uma alternativa de apoio.
Nesse momento em que o presidente Lula está preso, está definida uma estratégia de levar adiante a sua candidatura apesar das dificuldades e há uma enorme indefinição, apesar de que o tempo está correndo. O mais interessante seria estabelecer um programa comum a todos os atores, e aí eu envolvo candidatos, movimentos e partidos, desse campo à esquerda do centro, que pudesse servir de guarda-chuva tanto para um eventual segundo turno, no qual essas forças terão que estar juntas, não sei ao redor de quem, mas a lógica diria que elas deveriam estar juntas, quanto para eventuais decisões ainda no primeiro turno, que nesse momento são impossíveis de dizer quais seriam, tal é o grau de indeterminação.
Os quadros do PT concordam hoje que quem definirá o destino da legenda é Lula, que está preso. Como vê essa situação?
O protagonismo do ex-presidente Lula é consequência do lulismo. À medida que o lulismo foi se configurando como o resultado mais importante do realinhamento eleitoral, aquele que é o pivô do lulismo ganha uma força extraordinária e isso aconteceria em qualquer democracia. Quando um líder com vocação presidencial em um regime presidencialista ganha essa marca, que é de estar à frente de um movimento de um bloco majoritário do eleitorado, é quase inevitável que o partido ao qual ele pertence o siga de maneira praticamente automática.
A esquerda está fragmentada hoje. E nas sondagens eleitorais, nos cenários sem o Lula, a esquerda também estaria fora do segundo turno. Como o senhor vê essa possibilidade da esquerda se unir para não estar fora do segundo turno?
Na realidade, você não teve uma fragmentação tão grande. O que aconteceu foi que no processo de crise do lulismo, um aliado tradicional que é o PC do B optou por uma candidatura autônoma, o que é importante, mas tem um significado limitado, porque não é uma candidatura com uma vocação majoritária. O PSOL optou por uma candidatura de uma liderança popular expressiva, que é o Guilherme Boulos, cuja campanha está apenas começando, de modo que nós não sabemos como ela vai evoluir, e a candidatura Ciro Gomes é uma candidatura que de alguma maneira sempre esteve posta e está entrando no lugar do que seria a candidatura do ex-governador Eduardo Campos, que sofreu aquela fatalidade do acidente de avião e morreu, e estão transitando ambos na mesma faixa ideológica.
Eu arriscaria dizer, é um palpite, que a tendência será esses grupos estarem juntos no segundo turno, em torno de qualquer candidato da esquerda que esteja na disputa. A instituição do segundo turno é muito importante para entender as eleições no Brasil, determinados segmentos podem testar suas possibilidades no primeiro turno para se juntar no segundo. Mas para que isso aconteça, é importante que alguém desse campo vá para o segundo turno. Isso vai talvez criar uma tensão quando chegarmos mais perto do primeiro turno, mas da maneira como as coisas estão desenhadas hoje, é possível que a gente só enxergue uma definição depois que começar a propaganda na televisão.
A entrevista é de Mariana Sanches, publicada por BBC Brasil e Caminho Político.

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