Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso

Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso
Cons. Benjamin Duarte Monteiro, Nº 01, Ed. Marechal Rondon

Prefeitura Municipal de Tangará da Serra

Prefeitura Municipal de Tangará da Serra
Avenida Brasil, 2351 - N, Jardim Europa, 78.300-901 (65) 3311-4800

Deputado Estadual Drº. Eugênio de Paiva (PSB-40)

Deputado Estadual Drº. Eugênio de Paiva (PSB-40)
Agora como deputado estadual, Eugênio tem sido a voz do Araguaia, representa o #VALEDOARAGUAIA! 100% ARAGUAIA!🏆

Governo de Mato Grosso

Governo de Mato Grosso
Palácio Paiaguás - Rua Des. Carlos Avalone, s/n - Centro Político Administrativo

Prefeitura de Rondonópolis

Prefeitura de Rondonópolis
Endereço: Avenida Duque de Caxias, 1000, Vila Aurora, 78740-022 Telefone: (66) 3411 - 3500 WhatsApp (Ouvidoria): (66) 9 8438 - 0857

domingo, 31 de março de 2019

" "Apontamentos sobre mentira, verdade e jornalismo", por Rafiza Varão"

Primeiro, pós-verdade se tornou palavra do ano no dicionário Oxford, em 2016. Ainda não se tratava, contudo, de um ataque ao jornalismo. A expressão abarcava a tendência crescente em ambientes informacionais (em especial nas mídias digitais) de reforçarmos nossas crenças e evitarmos aquilo que delas destoa, ou aquilo que pode destruí-las. Foi apenas no ano seguinte que a prática jornalística se viu confrontada de maneira mais forte pelo rótulo fake news e passou a ter um de seus fundamentos questionado todos os dias: a de que seus produtos apresentam conteúdo verdadeiro. Essa não é acusação nova. Desde a industrialização, pelo menos, os jornais vêm sendo tachados de mentirosos e manipuladores. Entretanto, é incontestável que, entre 2017 e 2019, essa queixa tenha se tornado uma constante não só quando a imprensa erra, mas também quando ela apresenta fatos checados a partir de uma rigorosa apuração. Esse fenômeno, que se relaciona também com a categoria de pós-verdade, se tornou mais intenso a partir da estratégia do presidente estadunidense Donald Trump de aplicar o rótulo fake news aos veículos jornalísticos que não fizeram as vezes de orgãos oficiais de seu governo. De modo deliberado, discriminadamente, a intenção é abalar a credibilidade do jornalismo profissional, ao passo em que se propaga a ideia entre seu eleitorado de que o governo Trump é portador oficial da verdade (tática que vem ganhando adeptos em outros governos nacionais). A audiência, os seguidores, os usuários, quaisquer nome que tiverem, têm sido levados a agir da mesma maneira.
Mas o que se deixa de vislumbrar com esses ataques, que muitos chamam de guerra à imprensa e cujo sentido é plenamente político, é que, na maioria das vezes, aquilo que esses mesmos usuários acabam chamando de fake news é rótulo que recai erroneamente sobre material jornalístico correto, pautado na precisa apuração dos fatos, mas que coloca em jogo o universo cultural no qual esses usuários comungam e do qual não abrem mão.
Dizer isso não significa afirmar que a imprensa não mente. Para citar um caso recente, um dos mais importantes jornais alemães, Der Spiegel, enfrentou a fraude jornalística em suas coxias, quando foi descoberto que o repórter Claas Relotius inventava as histórias que publicava no periódico. Do mesmo modo, não significa dizer que a imprensa não tenha sua parcela de culpa na má reputação evocada agora para lhe difamar. Os desvios da ética profissional deixam arranhões muito mais visíveis que os acertos. Mas o que deveria ser exceção a essa altura da profissionalização do jornalismo passou a ser visto como a regra pelo público. Mais que isso, o conteúdo não jornalístico passa a ter o mesmo peso de uma informação noticiosa. A propaganda política, por exemplo, desde o final do século XIX entendida como elemento de manipulação das massas, perde seu caráter negativo e circula, triunfante, como a verdade que a mídia esconde. Mensagens de WhatsApp circulam como hard news. Todavia, há que se lembrar que uma coisa é errar, algo inevitável nas rotinas que são preenchidas pela novidade. Outra é mentir, ação carregada de intenções, própria do uso de informações por interesses escusos.
Para reconstruir, em parte, esse cenário, algumas saídas têm aparecido, mas talvez precisemos de outras portas abertas. O mais comum é que se direcione a busca pela credibilidade no jornalismo aos atos de verificação de conteúdos após publicação. Essa não é uma alternativa ruim e as agências de checagem, que emergiram sobretudo nessa segunda metade de década, realizam trabalho importante no discernimento do que são fatos e do que é pura lorota. O foco no que é mentira, então, é o que se sobressai.
Mas e a verdade? Que tipo de fundamento ela representa para a prática jornalística? Talvez seja chegada a hora de, cada vez mais, se reforçar esse estatuto do jornalismo, em especial no quesito ético e na formação dos estudantes da área. O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, no artigo 4º, afirma: “O compromisso fundamental do jornalista é com a verdade no relato dos fatos, razão pela qual ele deve pautar seu trabalho pela precisa apuração e pela sua correta divulgação”. Ora, sendo assim, é dever do próprio jornalista defender o papel social do seu trabalho, sem o qual as sociedades contemporâneas não podem facilmente sobreviver, sobretudo em regimes democráticos, nos quais o direito à informação é assegurado.
Não se trata, aqui, de instituir uma verdade soberana, desvinculada de recortes e interpretações - toda verdade é atravessada por tais componentes. Mas deve-se evitar cair na armadilha do senso comum, que diz que cada um tem a “sua verdade”, como se o individual pudesse sempre se sobrepor ao social. Fatos são observáveis e são passíveis de narração. A água ferve a 100ºC. O ferro é um elemento químico de número atômico 26. A Xuxa é a Xuxa. O ano em que estamos no Brasil é 2019. O jornalista deve acirrar sua batalha por essa verdade: a dos fatos, da apuração, gerando credibilidade pela qualidade. E o público precisa perceber que onde não há imprensa livre, com profissionais que se pautem por esses princípios, o império da mentira será erguido, mas não pela mão dos jornalistas.
Obs.: Há vários conceitos e contextos para o uso do termo fake news. Neste texto, estamos falando apenas dos casos em que o jornalismo recebe o rótulo.
Rafiza Varão é doutora em Comunicação pela Universidade de Brasília (2012), na área de Teoria e Tecnologias da Comunicação. É mestre em Comunicação também pela Universidade de Brasília (2002), na área de Imagem e Som. Graduou-se em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo (1999). Leciona na Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília e trabalha especialmente com Teorias da Comunicação, Ética e Redação Jornalística. Coordena o projeto SOS Imprensa e é coordenadora editorial da FAC Livros.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Ame,cuide e respeite os idosos