Levantamento do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) mostra 114 óbitos registrados até terça-feira (30). Após terminar 2020 em queda, o número de mortes de profissionais de enfermagem por covid-19 voltou a acelerar neste ano no Brasil, acompanhando o recrudescimento da pandemia em todas as regiões e mesmo com a categoria fazendo parte dos grupos prioritários de vacinação. Antes de terminar, março já se tornou o mês em que mais houve mortes de enfermeiros, técnicos, auxiliares de enfermagem e obstetrizes por causa do novo coronavírus. Foram 114 óbitos até terça-feira (30), segundo levantamento do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen).
A marca supera o recorde anterior, de 108 mortes, registrado em julho passado, auge da primeira fase da doença no país, de acordo com o Observatório da Enfermagem, órgão da Cofen criado para acompanhar os casos de covid-19 na categoria.
Com a escalada atual, o Brasil alcançou a marca de 699 trabalhadores de enfermagem vítimas da doença em pouco mais de um ano de pandemia. O Cofen afirma que esse total responde por quase um quarto (23%) do total de mortes pela covid-19 entre os profissionais da categoria em todo o mundo, segundo dados do Conselho Internacional de Enfermagem.
O conselho federal destaca que os números, na realidade, podem ser maiores, por causa da subnotificação.
Os três meses iniciais de 2021 estão se mostrando mais letais para enfermeiros, com 231 óbitos até 30 de março, do que os primeiros 90 dias de pandemia no Brasil, que somou 201 vítimas.
A alta na letalidade entre trabalhadores da linha de frente, que parece acompanhar os indicadores do restante da população, disparou um alerta na categoria, uma vez que o grupo foi um dos primeiros a começar a receber a vacina, em janeiro.
“O que podemos observar é que somente a vacina não basta. Se não seguirmos as medidas sanitárias, se não tivermos o EPI [Equipamento de Proteção Individual) adequado e se a população não manter os cuidados com o isolamento, nós vamos cada vez mais expor os nossos profissionais da saúde”, disse Eduardo Fernando de Souza, enfermeiro e coordenador do Gabinete de Crise/Covid-19 do Cofen.
Souza alerta que a alta nos óbitos não deve ser interpretada como falta de eficácia dos imunizantes, mas sim que os profissionais de saúde não devem baixar a guarda.
“Não é porque eu tomei a vacina que estarei automaticamente imune. Cada organismo reage de um jeito e cada imunizante tem o seu tempo para gerar proteção”.
De acordo com ele, a maioria dos profissionais que tomou a CoronaVac já estão com a segunda dose, que é dada entre 14 e 28 dias após a primeira. Ainda assim, demora um tempo para se alcançar o ápice da resposta imune. O intervalo para as aplicações do imunizante da AstraZeneca/Oxford é de três meses.
A médica infectologista Sylvia Lemos Hinrichsen, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), nota que muitos colegas “tomam a primeira dose e baixam a guarda”. Por isso, em suas aulas e perfis nas redes sociais, ela investe em uma campanha informal que tem como mote “ninguém vai estar vacinado sem ter proteção”.
Falta de transparência dos dados
O Cofen reclama da falta de transparência dos dados do Ministério da Saúde sobre o número de vacinados no Brasil. Souza diz estranhar que, no Caderno de Monitoramento da Distribuição das Vacinas e Grupos a Serem Vacinados Contra a Covid-19 no Brasil, atualizado pelo órgão no dia 26, todos os estados constam com o mesmo indicador de 97% dos trabalhadores de saúde imunizados, como se não houvesse variações regionais. E não especifica quantos receberam uma ou duas doses.
O UOL entrou em contato com a pasta, mas não teve retorno.
Hinrichsen, infectologista da UFPE, evita tirar muitas conclusões sobre os dados do Cofen, pois sente falta de mais informações sobre o perfil das vítimas. Os dados não apontam, por exemplo, se as vítimas atuavam nas áreas exclusivas para atendimento à covid das unidades de saúde. No entanto, ela chama atenção para a alta das mortes seguir a evolução da pandemia no Brasil e vir na sequência das festas de final de ano, período de férias e depois o Carnaval.
“[A alta de óbitos] ocorre porque eles são profissionais de saúde ou porque são pessoas? Todos que estiverem mais em risco nesse período estarás mais propensos a adoecer, pois temos um vírus mais disseminado, pessoas mais relaxadas [com as medidas de isolamentos] ou com falsa impressão de que estavam imunizadas pela primeira dose das vacinas”, Sylvia Hinrichs.
Para a infectologista, o número crescente de vítimas entre os trabalhadores de enfermagem é um recado para toda a população. “Não é hora de baixar a guarda, de deixar de usar a máscara, higienizar as mãos e manter o distanciamento seguro. E ainda vamos ter que ter essas medidas até ter uma massa crítica maior de pessoas vacinadas, em de 70% a 90% da população.”
Guilherme Castellar/Caminho Político
Foto: Reuters – Adriano Machado
@CaminhoPolitico
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