A Lei federal n° 14.617/2023, sancionada no mês passado, instituiu agosto como o Mês da Primeira Infância. O objetivo é dedicar esse período do ano à promoção de ações de conscientização sobre a importância da atenção integral às gestantes e às crianças de até seis anos de idade e suas famílias. A lei orienta os setores do poder público e da sociedade a realizarem ações integradas para chamar a atenção para a importância dessa etapa crucial na vida do indivíduo. Em resumo, lembrar que devemos cuidar bem da primeira infância se queremos ter adultos saudáveis e equilibrados e, no contexto mais amplo, uma sociedade com essas virtudes.
Parece simples e elementar, mas não é nem uma nem outra coisa. Os desafios são enormes. Dificuldades socioeconômicas, estruturais, educacionais e nas áreas de saúde e assistência nos mostram o tamanho dos desafios nos desdobramentos de políticas públicas voltadas para a Primeira Infância. Dificuldades que, especialmente no Brasil, em geral, tenta-se resolver muito no papel, na elaboração de projetos, mas que, normalmente, enfrentam problemas de execução e nos resultados.
Decorre daí, talvez, uma certa tendência nacional por metas sempre parciais, prevendo por exemplo atingir até 50% ou até 70%, ou até Y em até X ano. Como se o parcial justificasse a vocação para fazer o possível, ao invés de buscar fazer sempre o melhor de nós. Essa é uma particularidade cultural que, infelizmente, marca o Brasil e que precisamos superar – assunto para outro dia.
Mas faço essa observação esclarecendo ser um otimista. Tudo bem que não me deslumbro com a simples existência de planos. Gosto da execução de iniciativas. Acredito que com ação e energia os êxitos nos enfrentamentos são conquistados. Se cada qual fizer o que deve ser feito na sua esfera, e buscarmos diálogo e cooperação, vamos sempre avançar.
Madre Tereza de Calcutá, em frase facilmente encontrada na internet, ensina que “por vezes sentimos que aquilo que fazemos não é senão uma gota de água no mar. Mas o mar seria menor se faltasse uma gota”. Olhando em volta, no âmbito dos Tribunais de Contas, em especial no TCE-MT, vejo que estamos contribuindo para além do possível, reconhecendo ainda estar longe do melhor.
Destaco os compromissos assumidos em 2022, na cidade de Fortaleza, durante o 1° Seminário Nacional “A Primeira Infância e os Tribunais de Contas”. Carta de propósitos, também assinada pelo nosso presidente conselheiro José Carlos Novelli, definiu uma série de iniciativas e as estamos executando, na mesma perspectiva da primeira infância, de um caminho que se pavimenta para alcançar destinos melhores.
O TCE-MT criou estruturas organizacionais voltadas para estudos, levantamentos, diagnósticos e avaliação de políticas públicas. Destaco a unidade que estou liderando, a Comissão Permanente de Educação e Cultura, COPEC. Embora nova, ela tem trabalhado com essas temáticas e já apresenta bons resultados.
No campo da interlocução, registro a recepção e decisiva contribuição do TCE (com mediação do Instituto Articule, proponente da iniciativa em nível nacional) para a criação em Mato Grosso do Gabinete de Articulação para a Efetividade da Política da Educação. O GAEPE-MT é instância de diálogo e cooperação que reúne mensalmente 19 instituições públicas e da sociedade civil, com prioridade para o debate de soluções para atendimento da política pública voltada à primeira infância. Do GAEPE-MT surgiu o Pacto Interinstitucional pela Educação na Primeira Infância (0 a 6 anos) e o trabalho em curso por adesão de instituições e atores públicos municipais.
Também no âmbito do GAEPE-MT e ativa atuação da COPEC, levantamento e diagnóstico para apurar a deficiência na oferta de creches nos municípios de Mato Grosso - e que identificou a falta de 15 mil vagas. Também a presença do TCE-MT na determinação aos gestores públicos municipais visando a organização criteriosa das filas de espera por vagas de creches. Agora, a ação propositiva, com uma estimativa de custos, busca sensibilizar Executivo e Legislativo na criação de um programa estadual para apoio aos municípios na construção e manutenção de creches.
Em outra ponta, merece referência a atuação do TCE apoiando iniciativa da Unicef, para dar sustentação concreta ao programa Busca Ativa Escolar, que trabalha o enfrentamento à evasão escolar de alunos, notadamente em consequência da pandemia. Várias outras iniciativas, consequência desses compromissos assumidos pelo TCE-MT, foram tomadas já com resultados, nessa linha de ajudar a pavimentar um caminho para alcançar destinos melhores. É uma atuação para além da fiscalização, principal missão de um órgão de controle.
Como sou de um Estado também com o bioma amazônico, vou associar a imagem do ser humano a uma árvore típica da Amazônia. Pense em uma castanheira, com seus cerca de 50 metros de altura e 3 a 5 metros de diâmetro. Uma árvore desse porte não resiste aos ventos, se não tiver a proteção de suas raízes. Assim é a primeira infância de um indivíduo. São as suas raízes, que sustentarão sua existência sadia no futuro. Se não forem tratadas com cuidado certamente não vão dar a sustentação que o adulto precisará. Pense nisso!
Com essa deixa, quero voltar à reflexão, de que de nada adianta a existência de um mês para celebrar uma causa se ela não nos move o ano inteiro, todos os dias. Parafraseando o colega conselheiro Edson José Ferrari (TCE-GO), lugar de criança é nos orçamentos públicos, nos investimentos sociais, na efetiva execução de políticas públicas.
Antonio Joaquim é conselheiro, ouvidor-geral e presidente da Comissão Permanente de Educação e Cultura do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT).
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