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quinta-feira, 13 de novembro de 2025

Entre o Trono e o Berço: O Abandono Afetivo de Dom Pedro I sob a Luz do Direito Contemporâneo

A história costuma ser generosa com os heróis, mas o tempo, implacável, revela os dramas humanos que se escondem por trás das coroas e dos decretos. Entre esses episódios está a abdicação de Dom Pedro I, ocorrida em 7 de abril de 1831, quando o imperador deixou o trono do Brasil — e, com ele, o próprio filho. O pequeno Pedro de Alcântara, futuro Dom Pedro II, tinha apenas cinco anos de idade quando o pai embarcou para Portugal, sem jamais voltar a vê-lo.
À época, o gesto foi justificado por razões políticas e dinásticas. O monarca partiu para assegurar o trono de sua filha, Dona Maria II, em terras portuguesas. Contudo, sob o olhar do Direito de Família contemporâneo, essa partida ganharia outra conotação: a de um ato de abandono afetivo.
Nos dias de hoje, entende-se que o dever parental não se resume ao sustento material. Ele envolve também o cuidado emocional, a convivência e o acompanhamento afetivo. O artigo 227 da Constituição Federal é claro ao afirmar que é dever da família, da sociedade e do Estado garantir à criança e ao adolescente o direito à convivência familiar e à dignidade. O Código Civil, por sua vez, determina que quem causa dano a outrem, inclusive por omissão, comete ato ilícito e deve reparar o prejuízo. E o Superior Tribunal de Justiça já consolidou o entendimento de que o abandono afetivo gera dano moral, lembrando que “amar é faculdade, mas cuidar é dever”.
À luz desses princípios, a ausência paterna de Dom Pedro I não seria vista apenas como uma decisão política, mas como uma violação ao dever jurídico de cuidado. O menino que ficou — órfão de mãe e, na prática, também de pai — cresceu à sombra da saudade e da solidão. Tornou-se um homem introspectivo, melancólico e de afetividade contida. O imperador ilustrado, símbolo de progresso e estabilidade, carregava, em silêncio, as marcas emocionais de um afeto interrompido.
A psicologia moderna chamaria isso de orfandade emocional; o Direito chamaria de dano moral. O fato é que, em meio a guerras e proclamações, o que realmente faltou a Dom Pedro II foi o abraço do pai.
Mais de um século depois, essa história nos convida a refletir sobre os vínculos que realmente sustentam a humanidade — não os laços de sangue, mas os de presença. Porque, no fim das contas, nenhum trono substitui a presença de um pai, e nenhum poder justifica o abandono de um filho.
Luciana Zamproni Branco, advogada, professora de Direito de Família na Faculdade Alffa Prime, especialista em Gestão Pública e sócia-proprietária do escritório Zamproni & Silva Advogados. 

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