Hermann Göring era o número 2 da Alemanha nazista, mas seu irmão Albert não poderia ter sido mais diferente: opositor do nazismo que salvou a vida de judeus. No entanto, o pós-guerra se revelou duro para o "bom Göring". Em março de 1938, homens em botas de couro e camisas pardas andavam pelas ruas de Viena. Eles pertenciam à organização paramilitar Sturmabteilung (SA), do Partido Nazista, e celebravam a anexação da Áustria pela Alemanha. Dois deles penduraram uma placa com os dizeres "sou uma porca judia" no pescoço de uma senhora idosa. Um homem se ofereceu para ajudá-la. Logo começou a briga entre ele e os camisas pardas, e o homem teve sorte de não ser espancado até a morte.
Em vez disso, ele acabou atrás das grades. Mas não ficou lá muito tempo devido ao seu nome: Albert Göring. Ele era irmão do reichsmarschall Hermann Göring, comandante-em-chefe da Luftwaffe e aliado mais próximo de Adolf Hitler. Mas Albert, ao contrário de Hermann, Göring era um opositor dos nazistas. "O que os camisas pardas estavam fazendo ia contra os seus valores", diz o historiador William Hastings Burke, autor do livro que, em alemão, recebeu o nome de O irmão de Hermann: quem foi Albert Göring?. "Ele não podia ficar parado."
Caminhos separados, mas interligados
Como esses dois irmãos podiam ser tão diferentes? Um era ambicioso e vaidoso. O outro, um charmoso bon vivant, um combatente da resistência, como Oskar Schindler. Se Hermann se tornou um aliado de Hitler já em 1922, Albert rejeitava o ideário de Hitler, se revoltava com a brutalidade dos nazistas e não tinha quaisquer ambições políticas.
Em 1929, Albert, um engenheiro mecânico, mudou-se para Viena. No início da década de 1930, ele entrou para a indústria cinematográfica como diretor técnico da Tobis-Sascha. Com preocupação ele acompanhava a perseguição de judeus e opositores políticos dos nazistas na Alemanha.
Parece estranho, diz Burke, mas foi justamente Hermann quem pediu ao irmão mais novo que conseguisse um papel num filme para a atriz Henny Porten. Na Alemanha, essa estrela do cinema mudo não tinha mais permissão para aparecer nas telas porque se recusava a abandonar o marido judeu. Henny era amiga de Emma, a esposa de Hermann Göring. Albert atendeu ao pedido do irmão.
Albert passa a auxiliar em fugas
Dois anos depois, os nazistas já haviam chegado também a Viena. Joseph Goebbels queriam incorporar a Tobis-Sascha à sua máquina de propaganda. O antigo chefe de Albert, Oskar Pilzer, havia sido um dos produtores de filmes mais bem-sucedidos da Europa até a proibição de judeus trabalharem na indústria cinematográfica. Quando a Gestapo o prendeu, Albert Göring interveio. Ele pessoalmente escoltou o antigo magnata do cinema até a fronteira italiana.
E Albert Göring voltaria a ajudar muitas outras vezes. Enquanto o irmão trabalhava para expandir a Luftwaffe, Albert conseguia documentos falsos para perseguidos, organizava rotas de fuga e fornecia dinheiro aos refugiados. Ele frequentemente usava o sobrenome para intimidar autoridades.
Ele também interveio a favor do compositor Franz Lehár, cuja esposa era judia: Albert pediu a Hermann que registrasse o relacionamento deles como um chamado casamento misto privilegiado. Assim, Sophie Lehár escapou da deportação para um campo de concentração.
Ajuda do irmão mais velho
Para ajudar os outros, Albert frequentemente recorria à ajuda de seu poderoso irmão – e surpreendentemente a obtinha. Se Hermann Göring era implacável como político, também era indulgente com a família, diz Burke. "De fato, Albert dava muitas dores de cabeça a Hermann, mas este o protegia – era seu irmão, e ele o amava."
Para Hermann Göring, explica o historiador australiano, havia uma hierarquia clara. "No topo estava ele mesmo. Depois vinha sua família, e então a pátria e o nazismo. Satisfazia seu ego poder proteger Albert."
Em 1939, Albert Göring foi nomeado diretor de exportações das fábricas da Škoda na cidade tcheca de Brno. "Não foi nepotismo, como alguns especularam. A administração tcheca queria Albert", relata Burke. "Eles esperavam proteger os interesses da Škoda, e quem melhor para fazer isso do que o irmão do big boss em Berlim?"
Na mira da Gestapo
E Albert fez exatamente o que se esperava dele. Ele se empenhou pelos tchecos e, além disso, apoiou ativamente a resistência tcheca ao nazismo, às vezes até mesmo repassando informações secretas que obtivera por meio de suas boas conexões comerciais e, sobretudo, por meio de seu irmão — por exemplo, a localização exata de um estaleiro de submarinos ou a planejada violação do pacto de não agressão entre Hitler e Stalin.
Testemunhas afirmam que ele também salvou vidas na Tchéquia. Diz-se que ele resgatou prisioneiros judeus do campo de concentração de Theresienstadt para trabalhos supostamente "essenciais para a guerra" nas fábricas da Škoda. "O comandante do campo concordou porque era Albert Göring", relatou mais tarde Jacques Benbassat, filho de um amigo de Albert. "Ele os levava de carro até a floresta e os libertava."
Mas as ações de Albert foram se tornando cada vez mais imprudentes, e ele entrou na mira da Gestapo, que o declarou inimigo do Estado. Ele só não parou na prisão porque Hermann ainda o protegia. "Mesmo quando o poder de Hermann estava em seu ponto mais baixo, em 1944, ele ainda arriscou a carreira política para salvar Albert", relata Burke.
O nome Göring vira maldição
A lealdade entre os irmãos era mútua. Com o fim do regime nazista, ambos foram presos. Durante os interrogatórios pelos americanos, Albert recusou-se a falar mal de Hermann e elogiou sua "afetuosidade". Os americanos não acreditaram quando ele afirmou não ser nazista. "O mesmo nome que o salvara repetidamente da Gestapo, sob o regime nazista, agora se revelava uma maldição", escreve Burke.
"O resultado do interrogatório de Albert Göring é uma das tentativas mais flagrantes de reabilitação e encobrimento que o SAIC [Seventh Army Interrogation Center, ou Centro de Inquérito do Sétimo Exército] já viu", observou o major americano Paul Kubala, que interrogou Albert, em 19 de setembro de 1945. A "falta de sutileza" de Albert podia "no melhor dos casos ser comparada ao porte físico de seu irmão obeso".
Na versão original em inglês, o livro de Burke se chama Trinta e Quatro, uma referência aos 34 nomes que Albert Göring listou em ordem alfabética: "Pessoas cujas vidas ou existência eu salvei por minha própria conta e risco (três mandados de prisão da Gestapo!)". Mas ninguém se deu ao trabalho de consultar as pessoas dessa lista, apesar de alguns nomes conhecidos estarem nelas.
A sorte de Albert só foi mudar quando um novo interrogador foi designado: Victor Parker era sobrinho de Sophie Lehár, que também estava na lista de Albert. Hermann Göring escapou da execução ingerindo uma cápsula de cianeto. Albert Göring acabou sendo libertado.
"Mas ele permaneceu um pária em seu próprio país – por causa de seu sobrenome", diz Burke. Após a Guerra, Göring não conseguiu mais encontrar trabalho como engenheiro e viveu de bicos e trabalhos de tradução. Ele foi socialmente isolado até sua morte, em 1966, aos 71 anos.
Albert como um modelo
"No fim, foi tudo muito triste para o Albert", diz Burke. Desde que ouviu falar dele pela primeira vez, numa reportagem de televisão em Sydney, na Austrália, quando tinha 22 anos, Burke ficou obcecado por essa história. Ele viajou para a Europa atrás de vestígios de Albert Göring e vasculhou arquivos, se encontrou com antigos conhecidos e com parentes de pessoas que Albert Göring teria ajudado. Até mesmo localizou o túmulo.
"Eu queria contar ao mundo sobre esse homem", diz Burke. O livro dele foi publicado em 2015, mas Albert Göring continua presente em sua vida. Um modelo como Albert Göring é necessário, diz Burke. "Ele teve a coragem de se opor ao autoritarismo e ao fascismo, mas, depois da Guerra, não saiu por aí contando isso para o mundo. Ele não buscava a fama, ele simplesmente manteve sua humanidade."
Não se pode comparar a Alemanha da década de 1930 com a Alemanha de hoje, acrescenta. "Mas vivemos em tempos nos quais o exemplo impressionante de Albert Göring é muito importante", opina.
Anos atrás, Burke submeteu ao Memorial do Holocausto Yad Vashem um pedido para que Albert Göring fosse reconhecido como "Justo entre as Nações". O pedido ainda não foi atendido. O sobrenome de Albert ainda se revelou difícil de ser ignorado.
Assessoria/Suzanne Cords/Caminho Político
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