
Você aí atrás, vou repetir: guarde esse celular. Você está lendo o quê aí? “Diz aqui que o filho do Lula é dono de um frigorífico da JBS”. Pois olha que bom exemplo pra gente começar a aula de hoje: o Lulinha não é dono desse frigorífico coisa nenhuma. Nunca foi. Este é um típico fake, mentira cabeluda. “Mas, na época do impeachment, eu recebi um post de que a Dilma tentou suicídio”. Outra mentira. Igualzinha à de que o delator Alberto Youssef tinha sido encontrado morto na véspera da eleição de 2014. E que a Xuxa está apoiando o Bolsonaro… Gente, o que não falta é fake.
Fofofakes
“Mas então, onde está a verdade?” Menino, você tocou no ponto: a verdade virou raridade, porque a mentira anda se espalhando mais depressa do que fogo em mato seco e a verdade é que nem diamante miúdo escondido em bacia de vidro moído. A mentira corre mais depressa do que água de morro abaixo e fogo de morro acima. Já a verdade é mais lenta do que a lesma, o caramujo e a tartaruga.
Sem contar que a mentira é muuuuuito mais interessante: Sérgio Moro é filiado ao PSDB. Os tucanos querem acabar com o Bolsa-Família. O cofre de Lula é maior do que a piscina do sítio de Atibaia.
E a verdade, tadinha, é só o desmentido disso tudo aí. Quem se interessa em ler desmentido, se nos acostumamos a gostar, curtir e desde sempre espalhamos maledicências, sob o nome de mexericos ou fofocas?
O primeiro passo para tentar assegurar alguma verdade aos eleitores no pleito deste ano, quando as fábricas de fake news já estão funcionando a todo vapor, foi dado pelo ministro Luiz Fux, ao assumir a presidência do TSE, criando uma comissão pra cuidar disso. Mas o próprio Fux sabe, embora não admita, que, neste momento, nem ele nem ninguém sabe como, objetivamente, enfrentar o problema. No máximo, conseguiu-se perceber o fenômeno. Constatou-se que é preciso fiscalizar e punir. E que é preciso atualizar a legislação para criminalizar as condutas tanto de quem transmite quanto de quem produz notícias falsas.
O cofre de Lula e o suicídio de Dilma
“Ah, mas desmentir é fácil. Agora mesmo, pelo senhor, ficamos sabendo que o Sérgio Moro não é filiado ao PSDB. Que o cofre do Lula não é do tamanho da piscina do sítio. Que a Dilma não quis se matar e que a Xuxa não está apoiando o Bolsonaro”.
Não é simples assim, crianças. Só parece. As fake news tornaram-se tão sofisticadas – da produção à disseminação – que é cada vez mais difícil o seu combate. Ora, se na internet brasileira circulam diariamente entre 3 mil a 5 mil notícias políticas, quem vai checar a veracidade disso tudo? Como atribuir culpa a alguém? Como identificar quem começou? Como punir quem simplesmente passou pra frente e se tornou cúmplice – de boa fé, diga-se – da disseminação de mentiras políticas?
“Caramba, o inferno é grande!” Não apenas grande, mas cheio de mil diabos, acrescento. Cristina Tardáguila, diretora da agência Lupa, especializada em distinguir o que é verdadeiro do que é falso no noticiário, lembrou outro dia que o Brasil gastou nos últimos meses a bagatela de R$ 60 milhões em publicidade pra popularizar os termos da reforma da Previdência, que nem votada foi. Mas até aqui não gastou nem um centavo para ajudar o eleitor – eu, tu, ele, nós, vós, eles – a distinguir a informação falsa da correta.
Desta vez é pra valer: acabaram com o 13°
“Sim, mas e agora? Será que dá pra se fazer alguma coisa para ajudar as pessoas a distinguirem a mentira da verdade”? Olha, eu não sei se os resultados serão tão bons quanto se espera. Mas uma boa campanha de publicidade em pílulas, aos poucos, ensinando o eleitor a desconfiar, a verificar a fonte da notícia, a conferir direitinho se é informação nova ou requentada… Já seria um bom começo, né? Há anos circula por aí a notícia de que o governo, na surdina, conseguiu aprovar um projeto que acaba com o 13º. A notícia já atravessou os governos Lula, Dilma e Temer. E o 13º aí, firme. E o povo acreditando que ele acabou de ser revogado…
“A saída então vai ser educar as pessoas?” Sim, o caminho é por aí. Se você nunca compartilhou uma notícia falsa e depois se arrependeu, levante o dedo. Eu, já. E me arrependi muito, até aprender a só repassar notícias sobre as quais tenha a mais absoluta certeza. Precisamos nos tornar cidadãos digitais.
Ulysses Guimarães dizia que a cidadania começa pelo alfabeto. Pois está na hora de nos acostumarmos com a ideia de que a cidadania pode até começar pelo alfabeto mas ela passa, necessariamente, pela responsabilidade digital.
“Tudo bem. Mas é possível saber se o PT enviou mesmo 2 bilhões de reais a Cuba? Que a própolis previne a dengue e o câncer? Que um pirulito com energético intoxicou milhares de crianças? Que o óleo de coco não tem colesterol?”
Vá ao Google, garoto. Ligue pra Anvisa. Se informe em fontes confiáveis. Cheque TODAS as informações. Agora, se você começou a desconfiar do que recebe no zap ou no e-mail, começou bem. A cidadania digital começa pela dúvida. Agora já podem ligar os celulares de novo. Mas, cuidado, heim? Esse troço é perigoso pra caramba!
Paulo José Cunha é professor, jornalista e escritor.
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