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domingo, 28 de abril de 2019

“O fim da embrionária televisão pública no Brasil”, por Wagner de Alcântara Aragão

Resultado de imagem para Wagner de Alcântara Aragão é jornalista e professorO sonho acabou ou, para não sermos deveras pessimista, foi drasticamente interrompido. Qual, entre tantos sonhos? O sonho de contarmos com uma emissora pública de televisão, como ocorre nas democracias consolidadas mundo afora. No último dia 10 de abril, por decisão do governo de Jair Bolsonaro, a TV Brasil, criada pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva em 2007, foi fundida à estatal TV NBR. É o aniquilamento definitivo do nosso projeto de televisão pública, em processo de desmonte desde o início do governo de Michel Temer, em 2016. Não se trata de mera medida administrativa. A decisão tem motivações político-ideológicas, nunca escondidas por Bolsonaro durante a eleição. Ignorando, ou fingindo ignorar, o princípio da complementaridade do sistema de radiodifusão aberta estabelecido pelo artigo 223 da Constituição da República; ignorando,
ou fingindo ignorar, a programação educativa, o fomento ao cinema nacional, a diversidade de vozes e culturas ecoadas pela emissora (ou justamente por isso mesmo), o então candidato prometia, e, como presidente eleito, cumpriu a promessa de extinguir a ainda florescente TV Brasil.
Da criação, em 2007, até o início de 2016, a TV Brasil vinha se constituindo como uma autêntica TV pública, seguindo o modelo de emissoras emblemáticas, como a BBC (Inglaterra), a France Televisón (França), a TVE (Espanha), a RAI (Itália), RTP (Portugal), a ARD e a ZDF (Alemanha).
A gestão era feita por um Conselho Curador, formado por 22 pessoas – sendo 15 delas indicadas pela sociedade civil, quatro representantes do governo federal (Executivo), um da Câmara dos Deputados, um do Senado e um representando os funcionários da empresa. Isso garantia autonomia administrativa e independência editorial.
A programação, de incontestável qualidade, também registrava audiência significativa, ao contrário do que apregoa o governo Bolsonaro. Além de picos como o das transmissões dos jogos da Série C do Brasileirão e dos desfiles das campeãs do Carnaval de São Paulo e do Rio de Janeiro, programas clássicos como Sem Censura, No Mundo da Bola, sessões de cinema nacional e os infantis matutinos cativaram público fiel.
Particularmente para o jornalismo, o fim da TV Brasil é uma perda irreparável. Era da emissora pública brasileira o “Caminhos da Reportagem”, premiado, que mergulhava em temas de relevância social ímpar. O “Repórter Brasil”, por sua vez, constituiu-se num telejornal plural, nunca servindo a interesses chapa-branca. O “Ver TV”, conduzido pelo jornalista, sociólogo e professor Laurindo Leal Filho, o Lalo, era o único espaço na televisão brasileira para falar dela própria, a televisão brasileira. Tudo está absolutamente ameaçado.
O fim da TV Brasil é um atentado contra a Constituição – como dissemos, o artigo 223 da Carta Magna estabelece a existência de canais de rádio e televisão privados, estatais e públicos. É um atentado contra a diversidade de vozes e pluralidade de ideias. Vai na contramão do que ocorre nos Estados-nações mais avançados do mundo.
Quando ferimos a Constituição e aniquilamos espaço para a circulação de pensamentos e culturas diversas, estamos no mínimo pondo freios na democracia. Que tenhamos lucidez e força para reverter esse retrocesso.
Wagner de Alcântara Aragão é jornalista e professor de disciplinas de Comunicação na rede estadual de ensino profissional do Paraná. Mestre em Estudos de Linguagens (UTFPR). Mantém um site de notícias (www.redemacuco.com.br) e promove cursos e oficinas nas áreas de Comunicação e Cultura, sobre as quais desenvolve pesquisas também.

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