
"Belo monstro" – é assim que o austríaco Erwin Kräutler, bispo emérito do Xingu, prefere se referir à barragem. Em 2010, ele se dirigiu duas vezes ao então presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, para manifestar sua preocupação sobre o projeto. "Lula me prometeu na época: nós nunca vamos empurrar esse projeto pela goela de vocês. Belo Monte só vai acontecer se todos estiverem de acordo."

Segundo Antônia Melo, da ONG Xingu Vivo, operadora e governo gostam de se eximir de responsabilidade nesse caso. "Esse projetos são projetos ditatoriais", resume ela, sobre uma luta de uma década. Ao longo dos anos, diz, as autoridades exerceram enorme pressão sobre as vozes críticas da sociedade civil. "Até hoje a Força Nacional está nos canteiros de obras."

Mas a principal promessa não foi cumprida. Todos os não indígenas deveriam ter sido expulsos. Mas imagens de satélite mostram como fazendeiros avançam cada vez mais sobre o leste do território. Garimpeiros, por sua vez, seguem ativos nos rios que bordeiam a terra Apyterewa, revirando as margens com escavadeiras e sugando o fundo do rio com tubulações acopladas a jangadas.
"A situação não está boa para nós, tem muitos invasores, garimpeiros, e eles estão contaminando o igarapé", diz o guia Kaworé Parakanã. Há tempos que seu povo não pode mais beber da água do rio nem pescar ali, devido ao alto teor de mercúrio.

As caminhonetes dos garimpeiros da região de São Félix do Xingu levam adesivos de Bolsonaro. O presidente, dizem, prometeu ficar do lado deles na campanha. E com o apoio de Bolsonaro eles se sentem mais à vontade para enfrentar as autoridades. Já houve, por exemplo, ataques a funcionários da Funai, órgão que neste ano foi tirado do Ministério da Justiça e colocado sob o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos.
"O problema não é mais jurídico. Hoje, o processo é político. Tem interesse político dentro da área, através de prefeitos, de vereadores e deputados, que têm interesse, que têm terras próximas às terras indígenas", diz José Cleanton Curioso Ribeiro, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), em Altamira.

Só no município de Anapu, que faz limite com Altamira, Barreto acompanha 16 casos de assassinato de ativistas. Nenhum até agora resolvido. Pois, afirma ela, a partir do momento em que interesses poderosos e advogados caros entram em jogo, um processo caminha facilmente até a prescrição. Por outro lado, explica, "se o Estado tem interesse em criminalizar um sujeito rápido, ele faz".
Isso atinge sobretudo membros da sociedade civil. Segundo a defensora pública, muitos juízes conservadores compartilham o pensamento do presidente Bolsonaro de que ativistas do MST são bandidos. Também a ideia, diz Barreto, de que fazendeiros podem atirar em invasores está impregnada na Justiça.
"A ideia da função social, que nós defendemos, do acesso à terra do pobre, não predomina no Judiciário", diz a defensora pública. Belo Monte, resume ela, não trouxe à região a prometida melhora na qualidade de vida. Pelo contrário: faltam água potável limpa e ruas transitáveis.
"Belo Monte não trouxe um benefício social efetivo para a população. Esse passivo negativo das demandas sociais ainda não se conseguiu sanar. E acho que vai levar muito tempo para sanar os impactos de Belo Monte."
Thomas Milz (de Altamira)Caminho Político
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