
Neste ano, os incêndios no Pantanal alcançaram cifras nunca antes vistas. O número de focos de calor (temperatura acima de 47°C) – indícios de queimadas – aumentaram quase 100% em relação à média dos últimos dez anos. Já são mais de 8 mil incêndios registrados. O governo do Mato Grosso do Sul estimou a área total destruída em 1,3 milhão de hectares e decretou estado de emergência.
Dias trabalha com números ainda maiores. Ele estima que, desde agosto, o fogo já consumiu 1,5 milhão de hectares. "Ter incêndios é normal. Mas anormal foi a proporção e a quantidade de área queimada." Um dos motivos, segundo o ambientalista, foi a estiagem extrema deste ano. Em 2018, com as muitas chuvas, muita biomassa se acumulou no bioma, e esta está queimando agora.
Em alguns casos, foram raios que causaram incêndios na planície alagada. "No Pantanal, o fogo é uma coisa que acontece até naturalmente. Há uma resiliência da própria vegetação a esses incêndios", relata Dias. "Mas neste ano, a quantidade foi extremamente fora do contexto."
O ambientalista atribui parte dos incêndios à situação nos outros dois países que fazem parte do bioma. Houve queimadas provenientes de Estados vizinhos, migrando da Bolívia e do Paraguai para o Pantanal brasileiro.

Rittl atribui a falta de visibilidade do Pantanal às enormes dimensões da Amazônia. Por essa região ter uma biodiversidade maior, como também mais desmatamento e mais incêndios, a Amazônia costuma se tornar sempre manchete.
A falta de visibilidade não só atinge a cobertura da imprensa, mas, também, as ações do governo, avalia Dias. "O governo não está muito preocupado. O Pantanal é uma região que poucas pessoas conhecem e acaba se dando menos valor a esse ambiente. A reação do governo federal aos incêndios foi um pouco demorada. É preciso ainda uma política de controle preventivo, e o governo deveria contribuir com isso."
Rittl concorda que o grande número de queimadas tem relação com o atual governo. "É reflexo do discurso de tolerância perante crimes, e que a legislação seria mudada, que um incêndio ilegal não será punido. A cada hora, o presidente Jair Bolsonaro e o ministro do meio ambiente, Ricardo Salles, estão se encontrando com aqueles que cometem crimes ambientais, seja na Amazônia, seja no garimpo, e sempre criam expectativa de que aquilo que é ilegal vai ser legalizado. Existe essa impressão de que este governo permitirá tudo", aponta.
Pantanal e Amazônia
Enquanto o Pantanal vive momentos de muita apreensão devido ao grande número de incêndios, a situação na Amazônia se acalmou. Entre os dias 24 de agosto e 24 de outubro, cerca de dez mil militares combateram os incêndios na Região Amazônica. A ação contribuiu para a queda nos atuais números de queimadas.

Para Dias, o bioma merecia um esforço maior de preservação. "O Pantanal é um ambiente singular, extremamente diferente de tudo, com uma biodiversidade menor que a da Amazônia, mas com um diferencial: na Amazônia, os animais não são facilmente visíveis como no Pantanal. O potencial para o turismo é extremamente grande."
O Pantanal ainda é um paraíso natural, conclui Dias, apontando que 83% da vegetação nativa está preservada.
Mas esse ambiente poderá sofrer grandes transformações em breve. "Haverá mudanças na legislação de zoneamento agroecológico para cana-de-açúcar no Brasil, que afetarão também o Pantanal. Além disso, a pecuária é outro vetor importante do desenvolvimento econômico na região", alerta Rittl.As mudanças mencionadas por Rittl foram alavancadas nesta semana por Bolsonaro. Na última quarta-feira (06/11), o presidente revogou o decreto que proibia o cultivo da cana-de-açúcar em áreas sensíveis do país, como a Amazônia e o Pantanal.
O decreto havia sido aprovado em setembro de 2009, durante o governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com o intuito de regulamentar a expansão sem controle do cultivo da cana de açúcar para produção de etanol em áreas de vegetação nativa.
A iniciativa de Bolsonaro foi condenada pelo ex-ministro do Meio Ambiente Carlos Minc, um dos iniciadores do decreto. Segundo ele, a decisão do presidente "mancha" a imagem do etanol no mercado mundial.
"O decreto que [Bolsonaro] revogou foi a maior vitória que obtive no Ministério do Meio Ambiente em defesa do Pantanal e da Amazônia contra a expansão descontrolada da cana de açúcar. É incrível!!!", escreveu o ex-ministro em sua conta no Twitter.
Thomas Milz/Caminho Político
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