
A primeira, por referência à paz que colocou termo à Guerra dos Trinta Anos, no séc. xvii, e que fundou ou solidificou o essencial da ideia moderna de nação e de soberania, e, ipso facto, também de fronteira, de muro, de separação e de identidade (tão inclusiva quanto exclusiva, pois uma coisa dificilmente vive sem a outra). Levámos, desde então, muito tempo, e com quanto esforço, a tentar, e em larga medida a conseguir, esbater o pior disso. Abrimos, integrámos, globalizámos, aceitámos, interagimos, circulámos, criámos pontes – ainda que com todas as imperfeições e defeitos, como é da natureza das coisas humanas. Mas muito fizemos, e à custa de sangue, suor e lágrimas. E agora? O que virá depois? Tanto mais quanto – mesmo antes da pandemia do vírus e da pandemia do medo, bem como do pandemónio da informação, da desinformação e da hipérbole – já se anunciavam, aqui ou ali, ou mesmo globalmente, sombras marcadas, nuvens escuras. Umberto Eco terá talvez, e infelizmente, cada vez mais razão sobre “a construção do inimigo” – não o vírus, mas o outro, o outro igual a nós, mas feito desigual por força do poder da “identidade” contra a ameaça e contra o medo.
O segundo, por referência ao lugar fundador do Facebook, aqui eleito símbolo (embora pudesse ser outro) das redes sociais e de todas as formas de “socialização” e “contacto” virtuais. Apesar dos pesares, e apesar de tudo, este isolamento de agora – constrangidos que estamos (e aninhados dentro de uma confortável, conquanto aparente a prazo, proteção de muralhas troianas) em face do avassalador inimigo SARS-CoV-2 e das suas representações e sugestões – não nos custa, afinal, tanto, porque temos tudo isso. Muito bem, muito bom. Mas também não nos custa tanto porque, de certa forma, já estávamos habituados a viver assim parte das nossas vidas. E agora? Até onde irá isso? Até onde julgaremos que pode ir essa imitação da verdadeira vida que é a (ilusória) proximidade virtual? Um ecrã não é um abraço, não é um afago, não é um olhar, não é pele com pele, cara com cara, mão com mão, boca com boca. Não é, realmente, a seiva da vida, nem o antídoto para o solipsismo. Andávamos já perto de o esquecer. Será que é agora?
Rui Patrício/Caminho Político
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