Um sujeito aproxima-se das pessoas nas ruas e defende suas propostas para a solução dos problemas da cidade, do país e, quem sabe, de toda a humanidade. Uma das suas soluções para o Brasil: eliminar o Bolsa Família, que só criou desempregados profissionais. Outra solução, essa para atrair investimentos e turistas para a periferia: construir um prédio de um quilômetro de altura. Mais essas: transformar as escolas em formadoras de atletas olímpicos e ensinar empreendedorismo para que todos possam sonhar em ser dono de banco.
Outras ideias que o sujeito defenderia conversando com alguém numa esquina. As periferias seriam interligadas por teleféricos, que substituiriam o transporte coletivo.
E vem então a proposta transformadora e revolucionária: a implantação de “programas de educação emocional que ensinem princípios éticos e valores morais”.
Assim, vagamente: que as escolas sejam disseminadoras de princípios éticos e morais. Que tenham “mais educação, ao invés de escolarização”. Que as pessoas sejam exercitadas para o sucesso em jornadas moralizantes da prosperidade.
Quem daria atenção a esse sujeito nas ruas? Quem poderia parar para ouvi-lo descrever com gestos como seria o prédio mais alto do mundo? Quem sairia dessa conversa certo de que falou com alguém que sabe como resolver os problemas da cidade? Poucos?
Esse sujeito existe, chama-se Pablo Marçal e foi normalizado até pela grande imprensa brasileira. É apresentado, inclusive por jornalistas famosos, como o homem que enfrentará Lula em 2026. É visto como o novo normal no Brasil das anormalidades.
Esse sujeito, que talvez não conseguisse levar adiante uma conversa de rua, pelos absurdos contidos das suas ideias, quer levar ética e moralidade às escolas. E quer que todos os brasileiros sejam ricos trabalhando honestamente.
Para a Justiça, por decisão já formalizada, esse sujeito pregador de moralidades é um bandido, um estelionatário condenado à prisão, favorecido pelo benefício da prescrição, um recurso sempre à disposição de quem tem dinheiro. Esse homem tem muito dinheiro. Um patrimônio de mais de R$ 200 milhões.
O sujeito que poucos veriam como normal., numa conversa de rua, passou a ser convincente a partir de conversas virtuais. Porque essa é a normalidade hoje: o mundo dos coachs, influencers e mágicos da internet.
Do mundo da internet, o sujeito que vê pobres e miseráveis como desempregados profissionais, saltou para o mundo real. E passou a convencer pobres e miseráveis de que eles, os que dependem do Bolsa Família, são não só desempregados, mas vagabundos profissionais.
O mágico do prédio de mil metros comove velhinhos que ele explorava com golpes pela internet. O grupo do qual ele faz parte é gigantesco.
Um levantamento do jornal O Globo mostra que, em média, um grande influenciador é investigado por semana pela polícia no Brasil. Não um influencer qualquer, mas alguém com fama e milhares de seguidores.
No ano passado, mais de cem influencers foram alvos da polícia. Aplicam golpes, fazem lavagem de dinheiro, realizam rifas e comandam jogos de azar clandestinos. São auxiliares do crime organizado, como esse ex-coach das escolas da moralidade. Movimentam milhões.
O principal truque de todos eles: induzir incautos a pensarem que podem acumular fortunas. Porque eles, os influenciadores, apresentam-se como prova de que é possível ficar milionário e desfilar com mulheres e carros pelo mundo.
Todos têm os mesmos métodos, mas só um deu o grande pulo do gato e se transformou na mais badalada figura pública brasileira. O influencer que saltou do mundo dos coachs para a arena da política como cachorro grande.
Na política, suas soluções não passam mais só pelas receitas particulares, para que cada um dê um jeito na vida, mas pelas propostas para uma cidade e, daqui a dois anos, para o país.
Não mais um cara que diz: eu dou um jeito na sua vidinha e lhe garanto prosperidade. Mas um sujeito que afirma: eu sou capaz de dar um jeito na sua cidade, a maior cidade do Brasil e uma das maiores do mundo. Com teleféricos e um prédio de mil metros.
Esse cara, que dificilmente poderia prosperar na vida com conversas analógicas, sai do mundo virtual para o mundo real com soluções de quinta série. E convence as pessoas de que pode fazer o que promete, inclusive contra elas.
Porque é um estelionatário condenado, um ladrão de aposentados, como lembram seus adversários políticos, mas é milionário. É um aplicador de golpes em velhinhas que ficou rico e agora tenta continuar enganando as mesmas velhinhas, seus filhos, netos, vizinhos, parentes.
Não há hoje outra figura pública mais falada no Brasil. Não há artista, cantor ou celebridade do mundo que ele habita que tenha a fama do cara que prega censura contra os livros e foi ovacionado na Bienal do Livro de São Paulo.
Adorado pelos jovens e por grandes empresários que financiam sua aventura política. Cortejado pela elite financeira de São Paulo. Idolatrado por moradores das periferias para os quais ele diz falar deliberadamente como se fosse um idiota, porque esses suburbanos seriam idiotas.
O que fazer para que a idiotia não tome conta dessa gente admiradora do guru que a trata como idiota? Quem souber, que avise.
Moisés Mendes é jornalista/Caminho Político
@caminhopolitico cpweb
Curta nosso Instagram: @caminhopoliticomt
Curta nosso facebook: /cp.web.96
Nenhum comentário:
Postar um comentário